quarta-feira, 24 de agosto de 2011

BOLSA DE VALORES: MITOS, LENDAS E CASCATAS.


- A Bolsa é um cassino; se você quer continuar ganhando, tem que continuar jogando e conseqüentemente se arriscando.

- Bolsa de Valores é como a televisão: uma máquina de fazer doidos.

- A BM&F, Bolsa de Mercadorias & Futuros, bem que poderia chamar-se "BM&I - Bolsa, Manicômio & Inferno". É exatamente esse o roteiro de quem se põe a meter dinheiro nesse troço.

- Especulação é coisa do Demônio! Quem investe na Bolsa é do Bem, quem especula na Bolsa é do Mal. O investidor ajuda as empresas que tem ações na bolsa e colabora com a economia do Brasil; o especulador só pensa em si mesmo.

O prezado leitor já deve ter ouvido essas outras pérolas sobre investimentos em Bolsa; ou até mesmo passado por situações que o fizeram concordar ou discordar delas. O fato é que, muitas destas colocações baseiam em experiências reais que só ocorreram por puro desconhecimento. Geralmente, esse tipo de frase é criado por quem se deu mal ao aplicar na Bolsa, seja por azar (tudo parecia levar ao lucro; quando, de repente, o governo resolveu mudar radicalmente as regras durante o andamento do jogo; justamente quando a bola que você acabou de chutar estava quase chegando ao gol...), seja por ser vítima da má fé de pessoas mal-intencionadas do meio.

Seja qual for o motivo; na Bolsa (assim como tudo na vida), quanto menos conhecimento você tiver maiores as chances de quebrar a cara, ser vítima de picaretas e de ser pego de calças curtas por qualquer decisão do Governo.

Não é a intenção de este artigo servir como um "Manual Prático de Investimento em Bolsa", aliás, este que vos escreve já teve pretensões de criar algo do tipo e até publicar na internet, nos idos de 2003...

Felizmente, isso se perdeu no cyber espaço e o destino fez-me o grandessíssimo favor de sumir com os disquetes onde guardava o bendito manual. O pretendemos aqui é tentar desmistificar algumas das barbaridades espalhadas por aí sobre o tema.

ü O QUE É A BOLSA?

É uma Sociedade Civil na qual se negociam ações e outros ativos financeiros no Mercado Secundário.

Ações?!! Mercado Secundário?!! Este artigo não era para esclarecer?!!

Denomina-se "Ação" a menor fração do capital de uma empresa, caso ela seja uma "Sociedade Anônima" (as famosas S.A. ou S/A). Existem Sociedades Anônimas de dois tipos: as de "Capital Fechado" (cujas ações não podem ser negociadas no Mercado Secundário) e as de "Capital Aberto" (cujas ações podem ser negociadas no Mercado Secundário).

E o que vem a ser "Mercado Secundário"? Sempre que uma Sociedade Anônima resolve aumentar seu Capital por meio do lançamento de ações, o faz no Mercado Primário. O interessado compra uma determinada quantidade de ações e o dinheiro vai direto para o caixa da Sociedade Anônima. Se por algum motivo, o cidadão em questão resolver vender esta quantidade de ações, recorre ao Mercado Secundário, formado pelas Bolsas de Valores e pelo chamado "Mercado de Balcão" (quando vende a outra pessoa ou empresa sem a intermediação de nenhuma Bolsa, tal prática está cada vez mais em desuso). Para simplificar, tomemos, por exemplo, a fabricação e comercialização de um automóvel:

- A montadora X fabrica um determinado veículo e envia um lote deste para uma concessionária;

- o cidadão João da Silva vai até a concessionária e adquire o veículo 0 km em centenas de suaves prestações que comem quase metade de sua renda;

- após uns 2 anos, João da Silva - por um motivo que é problema dele, não cabe a nós discutir aqui - resolve vender o veículo no Feirão do Anhembi.

Pois bem, comparando essa historinha corriqueira com o mercado de ações:

- A montadora seria a Sociedade Anônima emissora da ação;

- o veículo seria a ação;

- a concessionária seria uma instituição financeira credenciada pela S/A emissora para oferecer suas ações no mercado;

- o cidadão João da Silva seria qualquer investidor, inclusive ele mesmo, que além de comprar o carro resolveu também investir parte de suas economias em ações da S/A emissora;

- o Feirão do Anhembi seria a Bolsa de Valores.

Trocando em miúdos: a concessionária faz parte do "Mercado Primário", o feirão, do "Mercado Secundário".

Ao comprar um veículo 0 km em uma concessionária, o dinheiro vai direto para o caixa da mesma. Ao revender o mesmo veículo em um feirão de usados, o dinheiro vai para o vendedor e a montadora não vê um tostão.

Da mesma forma, quando se compra uma ação no Mercado Primário, o dinheiro vai direto para o caixa da Sociedade Anônima emissora; ao vender no Mercado Secundário, o dinheiro fica exclusivamente com o vendedor, a S/A emissora não sente nem o cheiro.

Outra analogia corriqueira: a Bolsa seria uma espécie de "cartório" onde são registradas todas as transferências de ações de um investidor a outro. Mais ou menos como um Cartório de Registro de Imóveis. Ainda comparando com o mercado de imóveis: cada compra e venda de imóvel pode ter a intermediação de um "corretor de imóveis", sendo que cada transação é registrada em um cartório (que cobra uma taxa) e o corretor leva a sua comissão. No mercado de ações, cada transação DEVE OBRIGATORIAMENTE ter a intermediação de um corretor que cobra sua corretagem e cada transação é devidamente registrada em cartório, ou melhor, na Bolsa, que também cobra a sua taxa. Seja na bolsa, seja no mercado de balcão, quem deseja comprar ou vender uma determinada quantidade de ações, deve sempre recorrer a uma Sociedade Corretora.

ü É POSSÍVEL "INVESTIR NA BOLSA"?

A expressão "investir na Bolsa" designa qualquer operação de compra de ações de qualquer empresa sociedade anônima de capital aberto. Mas é possível investir "diretamente na Bolsa?", ou seja, aplicar recursos para que a própria Bolsa opere? Ou ainda: a Bolsa é ela própria uma sociedade emissora? Ao redor do mundo, algumas Bolsas são emissoras, outras não.

No Brasil, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) até pouco tempo atrás era uma "sociedade civil sem fins lucrativos", ou seja, não era possível comprar ações da Bovespa, o termo "investir na Bovespa" significava simplesmente investir em ações de qualquer empresa emissora que tivesse suas ações negociadas na Bovespa. Recentemente, a Bovespa tornou-se uma Sociedade Anônima de Capital aberto, ou seja, uma empresa com fins lucrativos que tem suas ações negociadas tanto no Mercado Primário quanto no Mercado Secundário. Pouco tempo depois, a Bovespa fundiu-se com a Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), formando a Bovespa/BM&F, também uma sociedade anônima.

Ou seja, atualmente o termo "investir na Bolsa", pelo menos no caso de Bovespa/BM&F, significa adquirir ações de qualquer empresa de capital aberto listada na Bolsa inclusive a própria Bolsa.

ü INVESTIMENTO X ESPECULAÇÃO X MANIPULAÇÃO

É difícil explicar as diferenças entre "investimento", "especulação" e "manipulação"; até porque, para muitas pessoas, tais palavras podem até soar como sinônimos.

"Investimento", a princípio é qualquer aplicação em ações.

"Especulação" significa aplicar capital em ações de uma ou várias empresas com a expectativa dos preços elevarem-se em períodos curtos, gerando assim lucros a curto prazo. O popular, "comprar na baixa e vendar na alta".

"Manipulação" é quando se tem alguma "informação privilegiada" da qual se faz uso para obter vantagens no mercado. Por exemplo: um especulador é muito amigo de um diretor de uma sociedade emissora e recebe deste uma "informação quente que vai abalar o mercado". O especulador guarda para si tal informação e começa a comprar compulsivamente ações da tal empresa, sendo que o restante do mercado não sabe o porquê. Uma hora, tal "informação quente" chega ao mercado e o preço das ações sobe. Como o especulador comprou uma boa quantidade, tem em estoque e vende mais caro.

Repare aí a maior confusão que se faz em termos de Bolsa: confundir "especulação" com "manipulação". O "especulador" espera fazer lucro com a alta dos preços, baseado em tendências de mercado. O "manipulador" detém uma informação importante e esconde para si, podendo aproveitar-se até para forçar uma situação favorável.

ü CARTÓRIO OU CASSINO?

Afinal, a Bolsa é um "cartório" ou um "cassino"?

Certamente, a Bolsa tem funções semelhantes às de um cartório: todas as operações de compra e venda de ações (e outros ativos) realizadas por meio de corretoras credenciadas são registradas na Bolsa.

Por outro lado, quem já não ouviu o chavão "a Bolsa é um cassino"?

A Bolsa só pode ser considerada um "cassino" para quem faz dela um cassino. Se você compra um lote de ações de uma determinada empresa, só por comprar, e fica esperando que se preço suba para fazer lucro; aí realmente você está portando-se como um autêntico APOSTADOR.

Se você analisa o mercado, suas tendências e conjunturas cruza as informações e chega a conclusão de que vale a pena investir em uma determinada ação porque "tudo leva a crer que a probabilidade de alta desta ação é maior do que a de baixa", aí você já é um ESPECULADOR (e trate de livrar-se o quanto antes de todos os preconceitos existentes em torno desta palavra; não há nada de errado, imoral e nem ilegal em "especular")

Se você faz um estudo mais detalhado sobre a(s) empresa(s) na(s) qual (ais) pretende investir, seus fundamentos econômicos e financeiros, suas políticas de administração e relações com investidores, sua governança corporativa, suas perspectivas de mercado, a economia do País como um todo, de como a empresa poderá portar-se diante disso tudo e quais os resultados que ela pode atingir (e compartilhar com seus acionistas, na forma de dividendos e bonificações) não só a curto prazo como também a médio e longo prazos; aí você está agindo como um "INVESTIDOR".

Para quem diz que a Bolsa é um "cassino", só posso dizer que ambos os estabelecimentos tem uma coisa em comum: existem regras a serem cumpridas e limites a serem respeitados; para quem desconhece os próprios limites e acha que pode depender apenas da "sorte", a probabilidade de quebrar a cara é enorme, seja na Bolsa, no hipódromo, no jogo do bicho ou até mesmo em um cassino.

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